A morte do animal de estimação é quase sempre um assunto difícil de trabalhar quando os tutores são crianças.
Os pais tentaram esconder. Contudo, depois de uma semana internada na clínica veterinária, a filha de 11 anos se deu conta da morte do animal de estimação. Petita, uma poodle há 17 anos na família, não voltaria mais.
E agora? O que fazer?
Luto infantil
Na França, algumas escolas já reconhecem o luto infantil pela perda do animal de estimação como luto verdadeiro. Nesse sentido, seus efeitos podem ser comparáveis à morte de uma tia ou irmã, por exemplo. E não é para menos. Não raro a morte do cão ou gato é a primeira grande perda no mundo infantil. Em contrapartida, por terem vida curta, acabam morrendo antes mesmo dos avós.
Por isso que o sofrimento causado pela morte do mascote que interage com a criança é legítimo. Isso porque de um dia para o outro seu companheiro deixou de existir.
— O luto pela perda do animal é verdadeiro. É um vínculo bem construído de relação afetiva, de brincadeiras, de respeito mútuo. Uma relação afetiva consolidada com o passar do tempo — explica a psicoterapeuta Ana Figueiró.
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O que um mascote significa para uma criança?
O maior benefício do animal de estimação para o ser humano, e isso inclui crianças, é, sem dúvida, a companhia. Os animais de estimação estão inseridos em uma categoria distinta de animais. Tendo em vista o vínculo construído, o mascote pode ter importante papel como auxílio afetivo no desenvolvimento do relacionamento interpessoal. Essa relação se dá especialmente com cães e gatos, já que é alto o alto grau de socialização que essas espécies têm com o ser humano, interação que só foi possível depois de séculos de domesticação e convívio.
No universo infantil, o animal de estimação pode ganhar o título de melhor amigo e fiel confidente. O cão ou o gato não deixam de ser agentes educativos pois com eles a criança pode aprender a respeitar os limites do outro, brincar sem machucar, permitir ao mascote horários de sono e refeição sem intervenções.
— Isso é bastante comum nos dias de hoje. Uma vez que as famílias têm menos irmãos, também com o animal de estimação criança acaba estabelecendo uma relação de troca afetiva — explica a psicoterapeuta.
De acordo com Ana, a criança, não sendo a única na casa que precisa de atenção, pode aprender a compartilhar e a respeitar o outro, nem que esse outro seja um animal.
Mas mascote têm vida curta e, inevitavelmente, crianças vão ter que trabalhar, ainda em tenra idade, a morte dele.
Como ajudar em casa?
O luto pela perda do animal deve ser trabalhado em família. Logo após a despedida, à criança Ana recomenda dizer tudo aquilo que é dito na perda de um ente querido. “Em resumo, se encerrou um ciclo, ficaram as memórias. Com o tempo, a lembrança virá em forma de saudade, sem dor”, aconselha a psicoterapeuta que não recomenda ser a morte do animal um assunto proibido na casa.
— Deixem a criança falar, deixem ela chorar. E nessa hora estejam junto para dar afeto e compreensão.
Por outro lado, podem os pais estar com dificuldade em elaborar seus próprios lutos. Às vezes a mãe vai consolar o filho e acaba chorando com ele também.
— Se chorar, chorou. Não vale esconder. Uma vez que pais também são humanos, é bom os filhos começarem a entender isso — salienta a profissional.
Como saber se a criança precisa de ajuda profissional?
Ana Figueiró lembra que, devido a histórias pregressas, pode ser muito difícil para uma pessoa suportar a perda do animal, mas recomenda que a família se permita seis meses de tristeza. Porém, alterações de sono, de apetite, dificuldade de concentração, baixo rendimento escolar ou no trabalho, alterações de humor e até doenças frequentes devem ser consideradas como consequência de um luto mal elaborado.
— Quando algo sai do suportável, pode haver o surgimento de sintomas e esse é o momento em que se deve procurar ajuda — explica a psicoterapeuta.
Veja dicas para ajudar o luto infantil na morte do animal de estimação:
– Se possível, se permita elaborar o luto por seis meses. Ademais, choro e tristeza, ao se lembrar do animal, são manifestações que podem aparecer até dois anos depois da perda do mascote;
– Ainda que surja a vontade, não compre outro animal na semana seguinte. É aconselhável encerrar um ciclo para dar início a outro. Para uma pessoa, o tempo para se recuperar da perda pode ser de três meses enquanto que para outra pode ser de um ano. O que importa é a família entrar em consenso de qual o momento ideal para se ter outro animal em casa;
– Mesmo que você esteja abatido, procure recolher os pertences do mascote espalhados pela casa. Se a família estiver de acordo, pode deixar algum como lembrança. No entanto, evite deixá-los pela casa se isso o faz sofrer;
– A situação começa a melhorar na medida em que seu filho manifesta seus sentimentos. É mais fácil para ele elaborar o luto se tiver essa liberdade de falar da dor.
– E não tente ser super herói se você também está sofrendo. Dor e sentimentos não se controlam. É bom seu filho entender que você é humano como todo mundo.
— Do ponto de vista psicológico, pode ser interessante a criança trabalhar primeiro a morte do mascote. A experiência pode ser um ensaio para perda de relacionamentos mais expressivos como pais e avós — lembra Ana.
E por fim, para quem refuga a ideia de ter mascotes para proteger o filho de perdas futuras, é bom lembrar que ele não poderá ser protegido o tempo todo. Cedo ou tarde, a criança terá perdas.
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